terça-feira, 26 de outubro de 2010

Trabalho: onde está o limite ?

Cresci ouvindo que “o trabalho enobrece o homem”. Meu pai, a quem devo muito dos meus valores, repetia insistentemente esta frase, mesmo que eu tivesse apenas 14 anos e estivesse longe de ser um adulto que dependesse do trabalho. Este valor, porém, ficou fortemente gravado na prática. Nesta idade, já trabalhava com ele durante o verão para ganhar um “troquinho”. Ele foi justo e remunerou-me adequadamente. Enquanto meus amigos iam para a piscina do clube curtir o verão, eu e meu irmão ralávamos carregando caixas de bebida. Ao final do mês, porém, tínhamos um bom dinheiro para fazermos o que quiséssemos com ele. Isso se repetiu por, no mínimo, três anos seguidos.

Aprendi, assim, na minha adolescência, e comprovei logo no início da minha vida adulta, que trabalho não traz apenas dinheiro, mas uma satisfação muito forte. Um senso de realização magnífico. Sigmund Freud escreveu: “Para um homem ser feliz, basta trabalho e amor”.  Claro que estamos falando de um trabalho que nos estimula, que nos dá prazer. Quando assim o for, é fonte de felicidade. Mais que importante e necessário, ele é um pilar das nossas vidas. E me refiro a qualquer tipo de trabalho, desde aquele realizado por uma dona de casa, de um funcionário de uma empresa, de um profissional autônomo, de alguém que presta serviços comunitários, etc. Trabalho que, de alguma forma, traz uma satisfação para quem o realiza.

Preocupa-me, porém, quando vejo pessoas que levam a questão do trabalho tão a fundo que esquecem o outro lado da frase de Freud. Segundo ele, e conforme vejo e já experimentei, é preciso também amor. Aqui me atrevo a qualificar amor como amor por uma companheira, aos filhos, a si próprio, a saúde, ao próximo, a vida. Qualquer forma de amor que possa contrabalançar a dedicação e a energia que o trabalho nos exige.

Ninguém questiona a importância de atividades físicas nas nossas vidas. Correr, caminhar, pedalar, malhar ou jogar qualquer partida, comprovadamente, trazem benefícios para a nossa saúde e o corpo agradece. Passar dos limites nestas atividades, porém, treinando exaustivamente todos os dias, nos leva a entrar num processo de “overtraining”. Neste estágio, aquilo que deveria ser benéfico passa a ser um malefício. O saldo de energia tende ao negativo e o esporte deixa de ser algo saudável, mesmo parecendo que ainda nos mantêm felizes.

O álcool, se apreciado com moderação, pode ser elemento de descontração e aumento de sensação de prazer. Pode, contudo, se ingerido em quantidade e frequência alta, nos levar ao vício. O limite muitas vezes é tênue, mas, ao ser ultrapassado, inverte o sentido da coisa. Estamos sujeitos a ficar a alguns passos do alcoolismo, que é visto e tratado como uma doença.

Uso estes dois exemplos para chamar atenção ao fato de que o trabalho também possui uma linha tênue entre algo prazeroso, necessário, fundamental, e algo viciante, que deturpa, que pode trazer sofrimento a quem nos cerca. Trabalhar compulsivamente também pode ser visto como algo não saudável.

Não digo que não devemos focar no trabalho em muitos momentos importantes da nossa vida, da nossa carreira. Quem não ralou muito no primeiro emprego ? Quem não virou noites para fechar aquele negócio ou projeto ? Quem não dedicou finais de semana para mostrar que foi a escolha certa para aquele cargo ? Quem não trabalhou muito só para conseguir mais dinheiro ? Quem não fez tudo só para ver os filhos, os necessitados, os amigos... felizes ? Estas são situações normais da vida e vão ocorrer enquanto trabalharmos.

Estou falando daqueles que já se tornaram compulsivos em relação ao trabalho. Daqueles que esqueceram o amor de Freud, ou acham que o amor também vem do trabalho. Daqueles que, por anos, acham que podem abrir mão das relações, do cuidado da saúde, da família, do conhecimento, etc, em nome de “Não posso agora, tenho que trabalhar”. Sempre estão em estado de emergência e nunca saem. Assim como no esporte, o overtraining diminui o rendimento.  Ser um “workacholic” também não significa ter a melhor produtividade e nem ser o mais eficiente.

O corpo tem limites e estes limites vão encurtando com os anos. As relações humanas tem limites e, para não diminuirem, precisam ser cultivadas. Saber equilibrar trabalho com os demais aspectos da vida é uma virtude e deve ser festejada. As empresas também se beneficiam deste equilíbrio e, aquelas que estão a frente no seu tempo, incentivam esta atitude em seus colaboradores. A Betania Tanure, em seu livro “Executivos: Sucesso e (In)felicidade”, aborda com maestria os desafios na busca do sucesso pelo trabalho e o equilíbrio com a vida pessoal. Da resolução desta equação resulta a felicidade ou a infelicidade.

Antes de cruzar os limites, vale a pena buscar o equilíbrio.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Solidão e relacionamentos: tire proveito dos dois

Apesar da nossa condição fundamental de solidão (Irvin D. Yalom), a maioria de nós não gosta e foge dela. Precisamos de pessoas a todo momento a nossa volta para não nos deixar sós com nós mesmos (o nosso eu interior). Isto é o que eu tenho visto e sentido em muitas das minhas relações. Somos seres sociais e precisamos nos relacionar.

 

Já escrevi, porém, que acho que tanto a solidão quanto a sociabilização são importantes para nós. Cultivar relacionamentos íntimos ou mesmo superficiais são importantes para que possamos nos ver. As relações íntimas (parceiros, filhos, pais, irmãos, amigos, etc), principalmente, funcionam como um espelho nas nossas vidas e refletem muito nossas ações. Se somos alegres e felizes, normalmente esta é a energia que volta destes nossos entes queridos. Se estamos tristes e deprimidos, também podemos perceber na cara destas pessoas esta nossa condição.

 

Estar próximo de pessoas com alto astral é muito bom quando precisamos de uma mão para nos reerguermos de momentos difíceis ou simplesmente para manter nosso astral elevado. Buscar o carinho da família, o conselho de um colega que nos conhece há muito tempo  ou conversar com um amigo do peito, são todos momentos fundamentais para a preservação ou reconstrução da autoestima. Não adianta achar que acordar de manhã, se olhar no espelho e dizer "Eu sou o cara" é condição suficiente para uma autoestima forte e sustentável.

 

Precisamos, portanto, nos relacionar. Da nossa ação frente aos outros, vão surgir os feedbacks sinceros de quem de fato nós somos. E nada melhor que uma criança para o reflexo mais verdadeiro. Se nos munimos, porém, de uma persona que nada tem a ver com quem somos, a leitura nos conduzirá para um caminho errado, não sincero. 

 

Relacionar-se, assim, é muito bom e necessário. Mas relacionar-se só para fugir da solidão, pode ser um erro. Na ânsia de não ficar só, muitos se mantêm em relações ruins só para cumprir a agenda social, familiar, etc, ou mesmo por que não suportam ficar sozinhos. Isto quer dizer que não se bastam, não se aguentam a si mesmos. Antes mal acompanhado do que só. Criou-se uma inversão do famoso ditado. 

 

Fugir da solidão pode nos levar a um caminho não em sintonia com nosso verdadeiro Eu. Nossos reais desejos vem de dentro, do fundo do nosso coração, da alma ou do inconsciente, seja lá como queremos chamar. Eles brotam dentro de nós por uma voz difusa, difícil, muitas vezes, de interpretar.

 

Só a solidão nos permite de fato sentir. Mas sentir o quê ? Sentir o que está doendo ou incomodando. Sentir o que nos dá prazer, o que nos faz feliz, sem máscaras, sem personas. Esta condição, porém, de autoconhecimento, leva a um forte dilema que é a escolha. Muitos não querem ter que escolher e fogem da liberdade de viver como desejam. Toda escolha requer uma renúncia (jargão popular) e por isto é tão difícil. Momentos de solidão nos conduzem às dores, encarando de frente o que somos e sentimos, mas são fundamentais para a nossa evolução.

 

Por isso considero que as duas situações são importantes no nosso desenvolvimento como seres humanos. Só, para nos sentirmos. Relacionando-nos, para nos vermos.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Qual é a minha idade ?

Quantos anos de fato eu tenho ? Sempre me pergunto isso e a resposta é que depende. Por que depende ? Por que tenho todas as idades. Biologicamente, nasci em 64. Para algumas coisas, ainda tenho 16 anos. Para muitas, tipo a corrida e o trabalho, ainda sinto que estou longe dos 40. Para outras, como a busca do conhecimento, acho que já estou pra lá dos 50, chegando nos 60.

Quando olho para meus filhos Gabriel e Pedro, vejo neles interesses, jeitos, gostos, etc, para a idade biológica que eles realmente tem. Pequenas variações, mas eles são o tempo que eles viveram até agora. Eu, porém, não me sinto assim.

No trabalho, provavelmente, estou muito próximo da minha idade biológica. Visto-me formalmente como quem ocupa uma posição de quem já tem senioridade e precisa representar a empresa com base em seus valores. Muitas vezes, porém, ajo com a energia e garra de quem ainda está construindo a carreira. Em outras, levo a experiência de quem parece já estar há muitos anos naquele lugar.

Na vida pessoal, o espectro é muito mais amplo. Na música, pela qual sou fissurado, isto fica muito claro. Até hoje cultivo um prazer enorme pelas primeiras bandas da minha vida, como Rush, Led Zeppelin, Black Sabbath, Queen, Pink Floyd, etc, sem deixar de adorar aquelas dos anos 80 e 90, como U2, Bon Jovi, Fish, Pearl Jam, etc. Porém, curto muito bandas desta década como Coldplay, The Killers, Linkin Park, Muse, assim como as meninas Norah Jones, Shakira, Amy Winehouse, etc. Qual de fato é a minha idade musical ?

Esses dias uma amiga minha me disse que eu me vestia igual a meu filho. Aquilo me deixou intrigado. "Será ?" pensei. "Vou ter que voltar à terapia e trabalhar isso". Na verdade, eu não sinto que estou copiando ele. Não tenho necessidade para tal. Sempre gostei de me sentir leve e mais esportivo na forma de vestir quando não estou trabalhando. Uso gravata e terno para o trabalho desde os meus 21 anos. Como preciso ser formal no trabalho, acho que me visto mais "sei lá como" na vida pessoal para contrabalançar.

E nos livros ? Curto temas atuais como os problemas causados pelos combustíveis fósseis, a sustentabilidade do planeta, o impacto das redes sociais no nosso comportamento, a fragilidade dos relacionamentos homem-mulher, etc, mas também busco conhecimento nos primórdios da psicanálise com Freud e Jung, na filosofia com Nietschke,  na história do mundo, na psicologia do amor, etc. Qual de fato é a minha idade literária ?

Fica portanto a pergunta de qual é nossa verdadeira idade. Acho que na metade da vida, temos todas as idades que vivemos e quem sabe algumas a mais. Depende dos nossos gostos, vontades, da nossa história. Simplesmente, depende do assunto.

Festas populares em Santa Catarina

Ontem participei de uma das festas mais populares do Brasil, a Oktoberfest de Blumenau. Se o GPS não indicasse que estávamos no estado de Santa Catarina, diria que fui transportado para a Alemanha ou mesmo para meu passado em Panambi, RS. E isso é o gostoso deste país. A cada região, um país diferente, peculiar.

Essa sensação já havia ocorrido na noite anterior, quando fui com meus pais na Marejada. Você não conhece a Marejada de Itajaí ? É a maior festa portuguesa e do pescado do Brasil. Faz parte do conjunto de festas populares aqui nos entornos de Blumenau. Itajaí, cidade portuária e vizinha da badalada Balneário Camboriú, hospeda esta festa que celebra a cultura dos açorianos e do alimento que vem do mar.

Na Marejada, comi um bolinho de bacalhau maravilhoso e curti uma banda que discorreu grande parte dos sucessos da MPB. A disputa ficava com um restaurante ao lado com um show de fado e com as duas cozinheiras na banca em frente que preparavam o camarão e as iscas de peixe frito. Quando elas começavam a cantar, todo mundo se virava e acompanhava o seu embalo e animação, ao invés do show de MPB. Isso sim que é popular!

Quando a protagonista principal do palco cantou "Sou caipira, pira, pora, nossa. Senhora de Aparecida. Ilumina a mina escura e funda..." lembrei que esta música me veio a cabeça no dia 12 de outubro. Recém tinha vindo de um final de semana maravilhoso no interior de São Paulo (caipira), era dia de Nossa Senhora de Aparecida e começava o resgate dos mineiros no Chile (ilumina a mina escura e funda). Que coincidência, não ?!

Ontem fui com meu pai na principal festa da região que é a Oktoberfest de Blumenau. Estava muito boa. Com todas as tradições que lembro da cultura alemã e que fizeram parte da minha infância no interior do Rio Grande do Sul. Festa aqui, para a galera mais nova, não significa balada. Festa aqui representa um grande salão, com amplo espaço para mesas, para dança, a banda e bares para bebida e comida.

A disposição do ambiente é muito similar aos das festas que frequentava quando criança. As mesas grandes, com bancos para sentar e não cadeiras, servem para juntar um monte de gente em volta delas. Nada de pequenos grupos. A ideia é que todos se confraternizem. A pista de dança, assim como todo ambiente, é clara e iluminada. Ninguém deve ter vergonha de dançar, pois a dança é uma expressão de alegria. Ambiente familiar e aconchegante, no sentido literal da palavra. Tudo regado a muito chopp.

Estas duas noites me fizeram pensar na importância destes rituais. Como eles congregam as pessoas e celebram o lado gostoso da vida. São festas populares que as pessoas pagam para participar. Todos buscam felicidade e diversão. Isto faz parte das nossas vidas. Todos ali saíram mais leves, com certeza.

Quando penso na vida urbana que levo em São Paulo, pergunto-me: "Quais são as minhas Marejadas e Oktoberfests ?" Fica um certo vazio. Posso dizer que é o Carnaval no Sambódromo ? Seria a Festa Junina no colégio ou no clube. O Carnaval, sem dúvida, é nossa festa mais popular, mas, a grande maioria, aproveita para viajar. As festas juninas não parecem ter a mesma pulsão das duas festas que participei. São restritas e, às vezes, acho que ocorrem para cumprir tabela. Gostoso sim é participar de uma festa que as pessoas escolheram participar. Ninguém convidou e, ao mesmo tempo, todos se convidaram.

Recomendo. Participem das duas. Cultura catarinense, alemã, portuguesa e brasileira.

E tudo tem um começo...

Hoje acordei e decidi colocar em prática a ideia de criar um blog. Há muito venho querendo escrever, porém sem saber como. Tenho me experimentado no facebook, em capítulos de um livro ou mesmo em cartas e e-mails. Nada até agora satisfez a minha vontade de colocar as coisas para fora.

Semana passada recebi uma mensagem de um amigo no facebook para olhar o seu blog. Dois dias depois, minha prima me falou de um blog de uma amiga sua. Estava se formando a ideia.  "Por que não o meu blog ?"  pensei. Tem dias que estou cheio de ideias que preciso colocar para fora e compartilhar com alguém. Um blog seria uma boa forma de satisfazer a minha vontade. E cá estou eu.

Logo que comecei meu projeto, sou solicitado a escolher um nome para o blog. Não precisei pensar muito, pois minha vontade é mesmo escrever sobre a vida e tudo que a cerca. "Viva la Vida" é um sentimento forte que me tem tomado de que devemos de fato viver a vida com tudo que ela tem, seja de bom ou mesmo de ruim. O bom é para curtir e celebrar e o ruim, que eu espero que seja muito pouco, para aprender e crescer. "Viva la Vida" hoje e daqui para frente, embalado pela música do Coldplay.

E por que eu estaria tão disposto a falar assim da vida ? A resposta certamente vem do momento de vida no qual me encontro. Digamos que estou no início da segunda metade da vida. Para este novo estágio, ainda sou uma criança e estou aprendendo muito. Entretanto, a primeira metade da vida me ensinou muita coisa. Construí um casamento que me deu muitas alegrias e dois filhos maravilhosos, criei uma carreira sólida, tive bons resultados, cultivei amizades, curti a família, mudei de cidades, nadei, pedalei, joguei tênis, joguei golfe e corri maratonas. De fato, não tenho nada do que me queixar. 

Nos últimos anos, porém, sinto que uma nova fase iniciou. Aquelas regras de vida tão cristalinas e que regeram a primeira metade da vida parecem um pouco difusas. Fui descobrindo que posso questioná-las. Não necessariamente quebrá-las, mas adaptá-las. Atuar para que elas sejam mudadas, evoluídas. Toda regra tem seu sentido de ser, mas o tempo pode mudar este sentido e, na segunda metade da vida, podemos e, quiçá devemos, questioná-las. Estamos mais maduros, mais inteligentes, com mais conhecimento. Será que de fato não devemos dar nossa contribuição para a evolução da vida ?

Pensando nisso é que resolvi começar este blog. Preciso escrever para colocar as minhas ideias e opiniões no papel. Assim, ali refletidas, eu mesmo posso avaliá-las melhor, com a vantagem de que num blog outras pessoas podem compartilhá-las, questioná-las, evoluí-las ou, mesmo, matá-las. A verdade é construída a cada dia e, o que hoje é verdade, amanhã pode não ser.

Vou colocar aqui minha visão sobre a vida. Ela se forma e evolui do passado que vivi e remexo de vez em quando, das minhas emoções e sentimentos, dos fatos que vivo diariamente, do meu trabalho, das conversas com amigos, colegas e família, dos livros que leio, etc..enfim, da vida. Gostei muito de dois livros que li da Lya Luft (Perdas e Ganhos e Múltipla Escolha). Dali tirei que a vida pode ser muito boa daqui até o fim, mas que temos que ser os atores desta história. Eu estou fazendo a minha parte.

Viva la vida hoy e siempre. Vejo vocês aqui. Contribuam.