domingo, 25 de março de 2018

Uma mulher sempre pronta para as mudanças


Uma mulher sempre pronta para as mudanças

Há alguns dias atrás, durante uma entrevista, fui perguntado sobre os impactos da inteligência artificial nas profissões e que conselho daria aos meus filhos frente às mudanças que ela pode trazer nas relações com o trabalho. Lembro de ter dito que o melhor a fazer é estar sempre estudando e pronto para novos desafios. Disse também que, na verdade, meus filhos provavelmente não terão uma única profissão e sim várias ao mesmo tempo e que, se a tecnologia vai suplantar alguma de suas competências, quem tiver muitas sempre estará à frente, tirando vantagem da situação.
Passados alguns dias, aquele pensamento me volta e percebo que, consistente com o que disse, esta sempre foi a forma como eu conduzi a minha própria vida. Ou seja, acredito na constante busca de novos conhecimentos e habilidades, no engajamento em projetos que trazem satisfação e retorno e em uma vida saudável em todos os aspectos. As ações práticas ligadas a este pensamento fizeram de mim um profissional sempre em evolução e me ajudaram a transpor inúmeras disrupções tecnológicas na carreira. Portanto, tenho fortes convicções de que são a base para enfrentar o desafio da nova relação que está sendo criada entre homens e máquinas.
Se sinto orgulho da minha própria trajetória profissional, ainda é pouco comparado com a admiração que sinto pela carreira e atitudes ao longo da vida profissional da Fabiane, minha companheira e esposa há mais de 30 anos. Posso até dizer que demorei muito a enxergar as qualidades que fazem dela uma profissional amada e respeitada por seus clientes. As atitudes e habilidades que ela foi desenvolvendo com o passar dos anos servem como um paralelo claro para qualquer um, em qualquer profissão, ameaçado ou não por disrupções tecnológicas ou de qualquer outra natureza.
Quando conheci a Fabi, ela era uma estudante de Educação Física. A escolha já era uma consequência natural baseada em uma educação voltada ao ensino e seguindo os passos da mãe, que é catedrática até hoje. A base estava plantada: educação, saúde e pessoas.
Ao casarmos, a Fabi teve que mudar de cidade e universidade, mantendo o curso na mesma área. Começou ali sua vida em Porto Alegre. Trabalhava de dia como professora e a noite suava para fazer 3km, em 15 minutos, na pista de corrida, para passar na prova de atletismo. Passados 2 anos, ela olhou para o lado e viu que eu estava me divertindo muito com o desenvolvimento de aplicativos e com projetos de dados em um grande banco do Sul do país. Como o dinheiro vinha mais fácil pelo meu lado com a profissão em Tecnologia da Informação, ela logo pensou: “Por que não fazer isso também? ”
A matrícula em um curso de programação (é assim que nós chamávamos há 30 anos o desenvolvimento ou codificação de aplicativos) foi rápida. Ela adorou o curso e curtiu muito a criatividade ligada à construção dos programas. Logo que concluiu os estudos, conseguiu um emprego e mudou de área: de professora à programadora de computador. Percebem a mudança?
Com a nova profissão, lacunas de conhecimento na nova área se abriram. A Fabi quis mudar novamente de curso superior. Eu aconselhei-a a concluir o curso e depois buscar uma formação na nova área (experiência própria de quem mudou, depois de 3 anos, de Engenharia para mais 4 anos de Ciências da Computação). Ela acabou se formando em Educação Física pelo IPA e, posteriormente, fez um pós-graduação em Análise de Sistemas pela PUC-RS. Era um espectro amplo de habilidades que pouco tinham de conexão naquela fase da vida.
Bons anos se passaram. As mudanças de emprego ajudaram-na a criar experiências em negócios e com relacionamentos distintos. Os dois filhos vieram e enriqueceram nossas vidas. Eles tornaram a jornada ainda mais prolongada, forçando um equilíbrio diário com trabalho, marido (eu, claro), cuidado com a saúde, vaidades e muito mais. Isto não a impediu de crescer de posições e complementar sua carreira com conhecimentos adicionais. Até o Kumon ajudou-a a reforçar a base matemática. E quando as necessidades de negócios dos seus clientes internos começaram a fazer pouco sentido para que ela as traduzisse para um programa de computador, ela entrou no curso de pós-graduação em Marketing na ESPM.
A vida parecia bem equacionada até um dia em que eu apareci com uma oportunidade de mudança pela IBM, onde já trabalhava há 6 anos, para São José dos Campos (SJC). Ela teve que largar o emprego e o curso na ESPM. Felizmente, o Sistema ERP que ela ajudou a construir, precisava ser implantado em uma fábrica em Taubaté. Lá foi a Fabi atuar como consultora. Que novas habilidades teve ela que desenvolver "on-the-job" enquanto implantava, com os usuários da fábrica, o próprio sistema que ela ajudara a construir? O sistema tinha forte atuação logística, o que a levou a fazer um curso de pós-graduação em Logística na FGV, em São José dos Campos. Novas competências a serem adquiridas.
Um ano após, apareço eu com a novidade do dia: "Fui promovido e transferido para São Paulo". A Fabi, naquele instante, estava iniciando uma academia de SAP para, de fato, ser uma consultora para implantação de sistemas logísticos. A academia era em São Paulo e nós ainda morávamos em SJC. Filhos ainda pequenos, marido trabalhando muito, tempos difíceis e mais e mais competências sendo acumuladas. Quando mudamos para São Paulo, ela precisava voltar à SJC para atender às aulas da pós-graduação em Logística. Essa, porém, ela concluiu. Já eram duas na sua conta.
A vinda para São Paulo trouxe muitas mudanças para a vida dela e da família. Foi difícil conciliar aquela nova vida com filhos pequenos, uma nova profissão onde todos queriam que ela viajasse e muitos outros fatores. Foi a hora de parar, pensar, refletir e mudar de profissão. O processo todo levou quase dois anos, mas culminou com voltar ao ponto de partida. Em uma cidade onde parecia que todo mundo corria e malhava, por que não retomar a sua formação original? E foi isto que aconteceu. A Fabi decidiu ativar seu canudo de Educação Física.
O início foi dando aulas de graça como personal trainer para ganhar experiência. As primeiras grandes alunas/amigas começaram a surgir. Percebendo que as habilidades estavam muito defasadas, fez alguns cursos de especialização. Focada e consistente com a sua natureza, foi atrás de uma nova pós-graduação, Fisiologia do Exercício, pela Unifesp. Estavam aí novas habilidades e competências se solidificando. Aos poucos, seus alunos foram ganhando corpo e sua agenda estava completa. Alguns anos se passaram e a nova carreira se consolidou.  As várias habilidades que a Fabi incorporou ao longo das suas várias atividades e a maturidade se aproximando a tornavam uma profissional cada vez melhor e requisitada. Seus alunos gostavam muito das suas aulas.
Mais uma vez, sou eu quem quebro este ciclo. Desta vez, porém, foi de comum acordo com ela. Uma oportunidade de trabalho pela IBM em Porto Alegre (POA) nos fez voltar para onde começamos. Mudanças significam oportunidades e não foi diferente naquela vez. Escolhemos morar em um condomínio com mais de 250 casas, pois ele parecia ser um mercado de trabalho para a Fabi. E assim foi.
Ainda em São Paulo, a Fabi quis montar um grupo de corridas, mas nunca tirou do papel. Em duas semanas em POA já estava lançada a FabiDiet Assessoria Esportiva. Cinco novas alunas de corrida estavam inscritas e começaram a correr três vezes por semana com o grupo. Foi um ano inteiro de chuva e sol na cabeça para ir consolidando o seu projeto. A sua perseverança fez com que muitos aderissem à corrida. Algumas poucas alunas de personal training complementavam sua agenda profissional. Até que um dia uma grande ideia brilhou na sua mente e toda uma vida veio à tona.
A Fabi criou a primeira corrida Kids do Condomínio Atmosfera. O evento aconteceu em um domingo de outono reunindo 60 crianças. Camisetas com um lagarto estampado (o condomínio era quase que dentro de uma reserva florestal), música, frutas, fotos e muita animação coloriram o dia cinzento. O evento foi um sucesso. Junto das crianças, vieram pais e parentes. Mais de 200 pessoas vibrando com a molecada correndo e sorrindo. Ou seja, todas as habilidades acumuladas até então se juntaram para a realização daquele projeto. Da criação ao marketing, à venda, à entrega do serviço, à liderança de equipe, ao financeiro e à satisfação do cliente. A Fabi colocou tudo isso em prática, somando tudo que ela havia acumulado de competências em várias áreas distintas de conhecimento. Era a realização de que todo conhecimento adquirido um dia será usado.  
Depois da corrida Kids I, veio a II e a III. Estes foram eventos de um dia, em anos distintos. Embalada pelo êxito desses eventos, criou um projeto ainda mais ambicioso: o Projeto Verão. Ele era uma "colônia de férias" nas tardes de verão, ao longo de 4 semanas e dentro do condomínio. Todas as habilidades da Fabi foram levadas ao extremo e o sucesso fez com que o projeto fosse repetido em uma segunda edição, atingindo mais de 80 crianças nessa etapa. Em paralelo ao trabalho com adultos e crianças, ela não se descuidava do trabalho voluntário com os velhinhos na igreja que frequentávamos. O sucesso, naquele momento, era todo dela.
Porém, em uma decisão envolvendo agora os quatro integrantes da família, resolvi aceitar um convite da IBM para regressar à São Paulo. A Fabi, novamente, teve que parar um projeto e começar um novo. Guerreira como é, não desperdiçou se quer uma semana de trabalho. Em menos de um mês, ela já tinha reconquistado algumas ex-alunas da sua atividade de personal training, resultado direto das suas qualidades e da forma como lida com seus clientes.  
Estabelecidos novamente em São Paulo, ela aproveitou para fazer as devidas atualizações de conhecimento e remontar sua carteira de alunos. Aqui se faz necessário explicar uma expressão que usei anteriormente de aluno(a)/amigo(a). A Fabi possui um carisma próprio e múltiplas habilidades desenvolvidas que a fazem focar em seus clientes, com uma atuação e preocupação genuínas com suas vidas e objetivos. A consequência disso é que muitos acabam ultrapassando a fronteira de ser somente alunos ou clientes e acabam se tornando também amigos.
A vida em São Paulo ganhou um novo ritmo e a maturidade ajudou a simplificar as coisas. O lema da Fabi para uma vida saudável é composto por dois grandes blocos: atividade física e boa alimentação. Para o primeiro, ela é mestre, e para o segundo, uma fiel seguidora. Ela pratica o que fala e acredita de fato nisso. Porém, não ficava satisfeita em não poder ajudar suas alunas e alunos em encontrar o equilíbrio na vida com a alimentação. Para romper com essa insatisfação, ela voltou à sala de aula. Desde fevereiro, está cursando graduação em Nutrição pelo Senac-SP. Novas habilidades virão para complementar uma profissional nos seus agora 50 anos de vida. Tenho certeza que ela será grande nesta área também, dando mais um passo importante na sua carreira profissional e levando bem-estar para quem ela toca.
A história da Fabi é um bom exemplo das capacidades que nós humanos temos de enfrentar as situações disruptivas e abrir novas frentes de oportunidades na vida. Claro que isso requer constante capacitação para incorporar novos conhecimentos, experiências distintas para desenvolver novas habilidades e atitudes proativas que explorem as oportunidades de maneira positiva.

Não importa os desafios que estejam à sua frente. Buscar novos conhecimentos e habilidades sempre será a melhor maneira de vencê-los. Estamos muito longe de termos uma tecnologia que adquira tantos conhecimentos em áreas tão diversas, passando de habilidades técnicas à humanas e de uma maneira tão natural. Até lá, nossa capacidade de adaptação para viver uma nova realidade é uma habilidade a ser ainda mais explorada. A trajetória profissional da Fabi demonstra que isso é possível e serve de inspiração para todos nós. E veja que aqui não comentei quase nada sobre sua vida pessoal, como mãe, mulher e companheira, o que daria um tom ainda mais admirável e empolgante. Mas isso é tema para uma outra história.

Alexandre Dietrich

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