Há alguns dias atrás, durante uma
entrevista, fui perguntado sobre os impactos da inteligência artificial nas
profissões e que conselho daria aos meus filhos frente às mudanças que ela pode
trazer nas relações com o trabalho. Lembro de ter dito que o melhor a fazer é
estar sempre estudando e pronto para novos desafios. Disse também que, na
verdade, meus filhos provavelmente não terão uma única profissão e sim várias
ao mesmo tempo e que, se a tecnologia vai suplantar alguma de suas competências,
quem tiver muitas sempre estará à frente, tirando vantagem da situação.
Passados alguns dias, aquele
pensamento me volta e percebo que, consistente com o que disse, esta sempre foi
a forma como eu conduzi a minha própria vida. Ou seja, acredito na constante busca
de novos conhecimentos e habilidades, no engajamento em projetos que trazem satisfação
e retorno e em uma vida saudável em todos os aspectos. As ações práticas
ligadas a este pensamento fizeram de mim um profissional sempre em evolução e
me ajudaram a transpor inúmeras disrupções tecnológicas na carreira. Portanto,
tenho fortes convicções de que são a base para enfrentar o desafio da nova
relação que está sendo criada entre homens e máquinas.
Se sinto orgulho da minha própria
trajetória profissional, ainda é pouco comparado com a admiração que sinto pela
carreira e atitudes ao longo da vida profissional da Fabiane, minha companheira
e esposa há mais de 30 anos. Posso até dizer que demorei muito a enxergar as
qualidades que fazem dela uma profissional amada e respeitada por seus
clientes. As atitudes e habilidades que ela foi desenvolvendo com o passar dos
anos servem como um paralelo claro para qualquer um, em qualquer profissão,
ameaçado ou não por disrupções tecnológicas ou de qualquer outra natureza.
Quando conheci a Fabi, ela era uma
estudante de Educação Física. A escolha já era uma consequência natural baseada
em uma educação voltada ao ensino e seguindo os passos da mãe, que é
catedrática até hoje. A base estava plantada: educação, saúde e pessoas.
Ao casarmos, a Fabi teve que mudar
de cidade e universidade, mantendo o curso na mesma área. Começou ali sua vida
em Porto Alegre. Trabalhava de dia como professora e a noite suava para fazer
3km, em 15 minutos, na pista de corrida, para passar na prova de atletismo. Passados
2 anos, ela olhou para o lado e viu que eu estava me divertindo muito com o
desenvolvimento de aplicativos e com projetos de dados em um grande banco do
Sul do país. Como o dinheiro vinha mais fácil pelo meu lado com a profissão em
Tecnologia da Informação, ela logo pensou: “Por que não fazer isso também? ”
A matrícula em um curso de
programação (é assim que nós chamávamos há 30 anos o desenvolvimento ou
codificação de aplicativos) foi rápida. Ela adorou o curso e curtiu muito a
criatividade ligada à construção dos programas. Logo que concluiu os estudos,
conseguiu um emprego e mudou de área: de professora à programadora de computador.
Percebem a mudança?
Com a nova profissão, lacunas de
conhecimento na nova área se abriram. A Fabi quis mudar novamente de curso
superior. Eu aconselhei-a a concluir o curso e depois buscar uma formação na nova
área (experiência própria de quem mudou, depois de 3 anos, de Engenharia para
mais 4 anos de Ciências da Computação). Ela acabou se formando em Educação
Física pelo IPA e, posteriormente, fez um pós-graduação em Análise de Sistemas
pela PUC-RS. Era um espectro amplo de habilidades que pouco tinham de conexão
naquela fase da vida.
Bons anos se passaram. As mudanças
de emprego ajudaram-na a criar experiências em negócios e com relacionamentos
distintos. Os dois filhos vieram e enriqueceram nossas vidas. Eles tornaram a jornada
ainda mais prolongada, forçando um equilíbrio diário com trabalho, marido (eu,
claro), cuidado com a saúde, vaidades e muito mais. Isto não a impediu de
crescer de posições e complementar sua carreira com conhecimentos adicionais.
Até o Kumon ajudou-a a reforçar a base matemática. E quando as necessidades de
negócios dos seus clientes internos começaram a fazer pouco sentido para que
ela as traduzisse para um programa de computador, ela entrou no curso de pós-graduação
em Marketing na ESPM.
A vida parecia bem equacionada até um
dia em que eu apareci com uma oportunidade de mudança pela IBM, onde já
trabalhava há 6 anos, para São José dos Campos (SJC). Ela teve que largar o
emprego e o curso na ESPM. Felizmente, o Sistema ERP que ela ajudou a construir,
precisava ser implantado em uma fábrica em Taubaté. Lá foi a Fabi atuar como
consultora. Que novas habilidades teve ela que desenvolver "on-the-job"
enquanto implantava, com os usuários da fábrica, o próprio sistema que ela
ajudara a construir? O sistema tinha forte atuação logística, o que a levou a fazer
um curso de pós-graduação em Logística na FGV, em São José dos Campos. Novas
competências a serem adquiridas.
Um ano após, apareço eu com a
novidade do dia: "Fui promovido e transferido para São Paulo". A Fabi,
naquele instante, estava iniciando uma academia de SAP para, de fato, ser uma
consultora para implantação de sistemas logísticos. A academia era em São Paulo
e nós ainda morávamos em SJC. Filhos ainda pequenos, marido trabalhando muito,
tempos difíceis e mais e mais competências sendo acumuladas. Quando mudamos
para São Paulo, ela precisava voltar à SJC para atender às aulas da pós-graduação
em Logística. Essa, porém, ela concluiu. Já eram duas na sua conta.
A vinda para São Paulo trouxe muitas
mudanças para a vida dela e da família. Foi difícil conciliar aquela nova vida
com filhos pequenos, uma nova profissão onde todos queriam que ela viajasse e
muitos outros fatores. Foi a hora de parar, pensar, refletir e mudar de
profissão. O processo todo levou quase dois anos, mas culminou com voltar ao
ponto de partida. Em uma cidade onde parecia que todo mundo corria e malhava,
por que não retomar a sua formação original? E foi isto que aconteceu. A Fabi
decidiu ativar seu canudo de Educação Física.
O início foi dando aulas de graça como
personal trainer para ganhar experiência. As primeiras grandes alunas/amigas
começaram a surgir. Percebendo que as habilidades estavam muito defasadas, fez
alguns cursos de especialização. Focada e consistente com a sua natureza, foi
atrás de uma nova pós-graduação, Fisiologia do Exercício, pela Unifesp. Estavam
aí novas habilidades e competências se solidificando. Aos poucos, seus alunos
foram ganhando corpo e sua agenda estava completa. Alguns anos se passaram e a
nova carreira se consolidou. As várias
habilidades que a Fabi incorporou ao longo das suas várias atividades e a
maturidade se aproximando a tornavam uma profissional cada vez melhor e
requisitada. Seus alunos gostavam muito das suas aulas.
Mais uma vez, sou eu quem quebro
este ciclo. Desta vez, porém, foi de comum acordo com ela. Uma oportunidade de
trabalho pela IBM em Porto Alegre (POA) nos fez voltar para onde começamos.
Mudanças significam oportunidades e não foi diferente naquela vez. Escolhemos morar
em um condomínio com mais de 250 casas, pois ele parecia ser um mercado de
trabalho para a Fabi. E assim foi.
Ainda em São Paulo, a Fabi quis
montar um grupo de corridas, mas nunca tirou do papel. Em duas semanas em POA
já estava lançada a FabiDiet Assessoria Esportiva. Cinco novas alunas de
corrida estavam inscritas e começaram a correr três vezes por semana com o
grupo. Foi um ano inteiro de chuva e sol na cabeça para ir consolidando o seu
projeto. A sua perseverança fez com que muitos aderissem à corrida. Algumas
poucas alunas de personal training complementavam sua agenda profissional. Até
que um dia uma grande ideia brilhou na sua mente e toda uma vida veio à tona.
A Fabi criou a primeira corrida Kids
do Condomínio Atmosfera. O evento aconteceu em um domingo de outono reunindo 60
crianças. Camisetas com um lagarto estampado (o condomínio era quase que dentro
de uma reserva florestal), música, frutas, fotos e muita animação coloriram o
dia cinzento. O evento foi um sucesso. Junto das crianças, vieram pais e
parentes. Mais de 200 pessoas vibrando com a molecada correndo e sorrindo. Ou
seja, todas as habilidades acumuladas até então se juntaram para a realização daquele
projeto. Da criação ao marketing, à venda, à entrega do serviço, à liderança de
equipe, ao financeiro e à satisfação do cliente. A Fabi colocou tudo isso em
prática, somando tudo que ela havia acumulado de competências em várias áreas
distintas de conhecimento. Era a realização de que todo conhecimento adquirido um
dia será usado.
Depois da corrida Kids I, veio a II
e a III. Estes foram eventos de um dia, em anos distintos. Embalada pelo êxito
desses eventos, criou um projeto ainda mais ambicioso: o Projeto Verão. Ele era
uma "colônia de férias" nas tardes de verão, ao longo de 4 semanas e
dentro do condomínio. Todas as habilidades da Fabi foram levadas ao extremo e o
sucesso fez com que o projeto fosse repetido em uma segunda edição, atingindo
mais de 80 crianças nessa etapa. Em paralelo ao trabalho com adultos e
crianças, ela não se descuidava do trabalho voluntário com os velhinhos na
igreja que frequentávamos. O sucesso, naquele momento, era todo dela.
Porém, em uma decisão envolvendo
agora os quatro integrantes da família, resolvi aceitar um convite da IBM para
regressar à São Paulo. A Fabi, novamente, teve que parar um projeto e começar
um novo. Guerreira como é, não desperdiçou se quer uma semana de trabalho. Em
menos de um mês, ela já tinha reconquistado algumas ex-alunas da sua atividade
de personal training, resultado direto das suas qualidades e da forma como lida
com seus clientes.
Estabelecidos novamente em São Paulo,
ela aproveitou para fazer as devidas atualizações de conhecimento e remontar
sua carteira de alunos. Aqui se faz necessário explicar uma expressão que usei
anteriormente de aluno(a)/amigo(a). A Fabi possui um carisma próprio e múltiplas
habilidades desenvolvidas que a fazem focar em seus clientes, com uma atuação e
preocupação genuínas com suas vidas e objetivos. A consequência disso é que muitos
acabam ultrapassando a fronteira de ser somente alunos ou clientes e acabam se
tornando também amigos.
A vida em São Paulo ganhou um novo
ritmo e a maturidade ajudou a simplificar as coisas. O lema da Fabi para uma
vida saudável é composto por dois grandes blocos: atividade física e boa
alimentação. Para o primeiro, ela é mestre, e para o segundo, uma fiel
seguidora. Ela pratica o que fala e acredita de fato nisso. Porém, não ficava satisfeita
em não poder ajudar suas alunas e alunos em encontrar o equilíbrio na vida com
a alimentação. Para romper com essa insatisfação, ela voltou à sala de aula.
Desde fevereiro, está cursando graduação em Nutrição pelo Senac-SP. Novas
habilidades virão para complementar uma profissional nos seus agora 50 anos de
vida. Tenho certeza que ela será grande nesta área também, dando mais um passo importante
na sua carreira profissional e levando bem-estar para quem ela toca.
A história da Fabi é um bom exemplo
das capacidades que nós humanos temos de enfrentar as situações disruptivas e
abrir novas frentes de oportunidades na vida. Claro que isso requer constante
capacitação para incorporar novos conhecimentos, experiências distintas para
desenvolver novas habilidades e atitudes proativas que explorem as
oportunidades de maneira positiva.
Não importa os desafios que estejam à
sua frente. Buscar novos conhecimentos e habilidades sempre será a melhor
maneira de vencê-los. Estamos muito longe de termos uma tecnologia que adquira
tantos conhecimentos em áreas tão diversas, passando de habilidades técnicas à
humanas e de uma maneira tão natural. Até lá, nossa capacidade de adaptação
para viver uma nova realidade é uma habilidade a ser ainda mais explorada. A
trajetória profissional da Fabi demonstra que isso é possível e serve de
inspiração para todos nós. E veja que aqui não comentei quase nada sobre sua
vida pessoal, como mãe, mulher e companheira, o que daria um tom ainda mais
admirável e empolgante. Mas isso é tema para uma outra história.
Alexandre Dietrich
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